sexta-feira, 20 de março de 2009

Os bilhetes para o Carnaval no Teatro

Devido à grande apetência do povo citadino pelo Carnaval, o Teatro Central decidiu também abrir as suas portas a este evento. Ao contrário das freguesias onde as entradas são gratuitas, o Teatro Central optou por bilhetes pagos o que gerou alguma polémica visto o Carnaval ser de graça desde sempre nas sociedades recreativas. Porém este facto não impediu que multidões se juntassem junto ao Teatro para comprar bilhetes para os dias do Entrudo.

O sucesso do Carnaval no Teatro Central ia aumentando de ano para ano de tal modo que a multidão já formava fila várias dias antes de abrir a bilheteira passando as noites ao relento sem arredar pé. Para evitar esta violência de passar noites e dias na fila, algumas pessoas com mais posses começaram a pagar a outras para ficarem em vez delas naquela longa espera.

Ainda assim e com o fim de terminar com aquela tortura desumana, algumas pessoas aficionadas do tal Carnaval tiveram a ideia de organizar a fila de modo a evitar passar tantas horas na rua ao frio e chuva. Era mais ou menos assim: cada pessoa que quisesse bilhetes deixava o seu nome e podia ir embora com a condição de estar presente quatro vezes por dia (às 8, às 12, às 18 e às 24 horas) altura em que se fazia a chamada dos nomes inscritos. Se a pessoa não estivesse presente à chamada perdia a sua vez.

Ora num destes anos passados, o patrão do meu primo, pessoa de elevado estatuto social e que gostava muito do Carnaval contratou uma figura típica muito conhecida por ter uns jeitinhos amaricados e fazer trabalhos domésticos em algumas casas nobres da cidade. Esse indivíduo era conhecido pelo nome de “Fresquinho”.

Vai então o “Fresquinho” dar o seu nome para a fila do Teatro a mando do patrão do meu primo comprometendo-se a comparecer nas chamadas seguintes até ao dia da abertura da bilheteira.

Acontece que talvez derivado ao ter apanhado o frio e a chuva da meia-noite ou aos trajes leves com que se exibia, o “Fresquinho” viu-se a braços com uma valente gripe e teve que informar o patrão do meu primo que não podia estar na próxima chamada para a compra dos famosos bilhetes. O nobre senhor, que viu a hora da chamada a aproximar-se, não teve outro remédio do que correr a juntar-se às centenas de pessoas que aguardavam ansiosamente ouvir o seus nomes.

Com o sucessivo gritar de nomes, o patrão do meu primo ficava cada vez mais receoso de não ouvir o seu no meu daquele burburinho todo.

Então a certa altura ouve-se alto e em bom som:

- “Fresquinho

O nobre senhor, como uma mola, põe-se aos saltos no meio da multidão e grita na direcção da porta do Teatro, provocando uma gargalhada geral:

- Sou eu, sou eu !


De: Júlio Silva - Futebol e Celebridades em 3D
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segunda-feira, 2 de março de 2009

Os Quadros Vivos

Aqui há uns anos atrás na Ilha Terceira, antes da época da televisão, havia grupos que iam de freguesia em freguesia com peças de teatro chamadas Comédias muito apreciadas pelo povo. O espectáculo começava com as “pancadas de Molière” antes de abrir o pano, seguido de um “drama para chorar”. Depois do intervalo era a vez da “comédia para rir”, outro intervalo e terminava o espectáculo com o “acto de variedades” consistindo em números musicais com coreografia e declamações de poesia. Era nesta parte que alguns grupos gostavam de incluir os chamados Quadros Vivos, cenas do quotidiano em que os actores permaneciam imóveis como se uma fotografia fosse tirada de uma qualquer cena da vida real. Uma cena muito usada e comovente era a despedida dos emigrantes no aeroporto em que os quadros representavam por sua vez, a chegada ao aeroporto, os abraços de despedida, a subida para o avião, os acenos, etc. Para que os actores pudessem mudar de posição entre os quadros a luz do palco e da plateia era apagada de modo a obter-se uma escuridão total durante breves segundos.

Num destes teatros estava presente a madrinha da minha prima que estava de visita à Terceira vinda dos Estados Unidos para onde tinha emigrado há muitos anos atrás. A tal senhora que sabia dos frequentes cortes de energia eléctrica que havia na Ilha andava sempre na companhia de uma forte lanterna (conhecida entre os terceirense como “foco” ou “focx”) que trouxera dos “States”. O que aconteceu é que quando a luz se apagou por completo para se dar início ao Quadros Vivos, a madrinha da minha prima que não estava habituada a esta modernice teatral pensou que era mais uma falta de luz e numa atitude de heroína levantou-se e dirigiu para o palco a potente lanterna mostrando assim um grupo de actores boquiabertos e encadeados a fazerem sinais para que alguém fizesse a senhora deixar o espectáculo continuar.


De: Júlio Silva - Futebol e Celebridades em 3D
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